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sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

“Pasión Argentina” - Bernarda Fink



Bernarda Fink

e Octeto Ibérico de Violoncelos
Elias Arizcuren (director)


Gulbenkian

23 de Janeiro de 2007




Carlos Guastavino
Cuatro canciones populares
1. Hermano
2. Abismo de Sed
3. El Sampedrino
4. Mi viña de Chapanay

Alberto Ginastera
Pampeana Nº. 2
(Robert Putowski e Jeroen den Herder,
solistas)

Cinco canciones populares
argentinas, op. 10
1. Chacarera
2. Triste
3. Zamba
4. Arrorró
5. Gato

Alberto Ginastera
Suite Ballet Estancia (instr.)
1. Los trabajadores agrícolas
2. Danza del trigo
3. Los peones de hacienda
4. El amenecer
5. Malambo

Carlos Guastavino
Canciones populares
1. Se equivocó la paloma
2. Milonga de los dos hermanos

Astor Piazzola
Tres Milongas
1. A Don Nicanor Paredes
2. Alguien le dice al Tango
3. El Títere

Versões de Elias Arizcuren e Pablo Escande
para o Octeto Ibérico de Violoncelo

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O poema épico Martin Fierro (1872-79), de José Hernandez, constitui na cultura argentina um importante marco histórico, anunciando o início de um sólido sentimento nacionalista neste país. Na referida obra persiste a fi gura do gaúcho, que paulatinamente se deixa contaminar e aniquilar pelo avanço da industrialização e pela cultura citadina, imagem tragicamente romântica que celebra a identidade argentina, a sua índole heróica, a sua virilidade. A partir de então, e ao longo de todo o século XX, esta tradição gauchesca tornar-se-ia um dos traços essenciais da cultura argentina. Antecedido por Francisco Hargreaves (1849–1900) e Juan Gutiérrez (1840-1906), na música dos quais desponta já um fi rme sentimento nacionalista, Alberto Williams representa o mais prolífico compositor da Generacion del 900. A sua obra para piano intitulada Aires de la Pampa, baseada em danças e canções gaúchas, é representativa do idioma musical argentino, a meio caminho entre a herança da música europeia e o folclore argentino.

Homóloga argentina do lied germânico, a canción de cámara, baseada na poesia de alguns dos mais destacados poetas argentinos, floresce plenamente neste ambiente de glorifi cação pátria, especialmente na seguinte geração de compositores (Generación del Centenario) os quais, aproveitando o momento coincidente com a celebração do centenário da independência da Argentina, ocorrida no início do século XIX, reafi rmaram na sua música este sentimento pátrio. Dividida entre a citação directa das fontes musicais folclóricas, como no caso da música de Juan Bautisa Massa (1885-1938) e uma expressão mais cosmopolita e subjectiva, através da adopção de uma estética próeuropeia, misturada com elementos da música tradicional argentina, como por exemplo em Luis Gianneo (1897-1968), pode afi rmar-se que esta tendência nacionalista perdurou praticamente até aos nossos dias. Contrariamente ao que se poderia imaginar, as infl uências étnicas presentes na cáncion de cámara provêm menos das culturas musicais pré-colombianas, advindo sobretudo da música crioula, substancialmente rural e telúrica, complexo mosaico de elementos espanhóis, num primeiro plano, mas também italianos, estes últimos por via da enorme afl uência de imigrantes italianos que no fi nal do século XIX se fi xaram na Argentina. Frequentemente, esta música crioula, consequência da mestiçagem de europeus e indígenas, aparece sob a forma de versões locais das danças de salão europeias, como a Valsa, a Escocesa, a Polka ou a Mazurka, interpretadas por instrumentos tradicionais argentinos (acordeão, bandoneon, guitarra, charango e bombo). É nesta passagem do meio rural para o meio culto da cáncion de cámara, que o piano adquire uma renovada dimensão, emulando as 3 sonoridades toscas dos instrumentos de factura popular e os ritmos impetuosos e festivos das danças campestres, sobre os quais se desenrola um cristalino e depurado lirismo.

Graças à enorme diversidade cultural e étnica presente nas diversas regiões do extenso território argentino, existe igualmente uma profusa quantidade de danças e cantos tradicionais, constituindo, no seu conjunto, um tesouro de inestimável valor etnomusicológico. Tanto a Chacarera quanto a Zamba, esta última evidenciando um forte ascendente da Zamacueca peruana, são danças de par tradicionais do nordeste argentino. Também o Gato, dança típica da região de La Pampa, é de origem crioula.

Através de um comum fenómeno de importação cultural, ocorrido no período de viragem entre os séculos XIX e XX, coincidindo com a deslocação massiva de indivíduos dos meios rurais para a cidade, em busca de trabalho, a Milonga, uma dança gauchesca, mas de raiz africana, adaptou-se naturalmente ao ambiente urbano de Buenos Aires. Cruzando-se então com a música europeia dos imigrantes que habitavam nos subúrbios pobres da cidade, foi um dos géneros que mais contribuiu para o nascimento do Tango no início do século XX, género que viria a ganhar uma enorme reputação, tornando-se símbolo incontestável da identidade argentina.

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