Cornucópia continua ciclo Tchekov com Christine Laurent.
Teatro do Bairro Alto, Lisboa, estreia dia 22 de Junho.
De 22 de Junho a 30 de Julho de 2006
Teatro do Bairro Alto, Lisboa
Tradução Nina Guerra e Filipe Guerra
Encenação, adaptação e guião de espectáculo Christine Laurent
Cenário e figurinos Cristina Reis
Desenho de luz Daniel Worm d’Assumpção
Som Vasco Pimentel
Interpretação Cleia Almeida, Dinarte Branco, Dinis Gomes, Luis Lima Barreto, Luis Miguel Cintra, Márcia Breia, Pedro Lacerda, Rita Durão, Rita Loureiro e Sofia Marques.
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O Teatro da Cornucópia, que há pouco representou A Gaivota, continua a sua abordagem da obra de Anton Tchekov com a apresentação de um novo espectáculo, a partir da última obra do mesmo autor: O Cerejal, peça para a qual a tradução adoptada de Nina Guerra e Filipe Guerra recupera o título mais próximo do original russo de O Ginjal.
Trata-se de um espectáculo de natureza e objectivos muito diferentes do trabalho anterior. Mais do que de uma apresentação da peça, trata-se aqui da apresentação de um trabalho sobre um texto de Tchekov, de uma tentativa de apropriação, por um grupo de actores, de um universo dramático e poético particularmente rico e complexo, motivador de múltiplos níveis de interpretação. Sem a pretensão de apresentar um trabalho acabado, a companhia apresentará ao público uma tentativa de leitura descarnada e sem defesas, como se quisesse transformar em espectáculo, expor perante o público, tanto como a peça, o seu próprio trabalho de ensaios, o seu convívio com cada frase, com cada personagem, com cada situação, com cada dificuldade, com a complexa estrutura de um texto construído com regras quase musicais.
O espectáculo foi dirigido por Christine Laurent, cineasta, argumentista e encenadora que regularmente tem sido chamada a colaborar com o Teatro da Cornucópia. Com a Companhia criou já quatro espectáculos: Diálogos em Roma de Francisco de Holanda, Barba Azul de Jean-Claude Biette, O Lírio de Molnár e D. João e Fausto de Grabbe. Para este trabalho sobre Tchekov, Christine Laurent adaptou a peça e criou um guião de espectáculo que insere também fragmentos da correspondência entre o autor e a sua mulher, a actriz do Teatro de Arte de Moscovo que, na encenação original de Konstantin Stanislavsky, interpretava o papel de Liubov Andreevna Ranevskaia, a dona do Ginjal.
O espectáculo deixa-se conduzir pela própria sequência dos actos da peça de Tchekov que tanto diz sobre as relações humanas e onde tão pouco é costume dizer que alguma coisa se passa. Quase não há intriga: uma fidalga, a proprietária arruinada de uma propriedade rural na Rússia pré-revolucionária do início do século XX, volta ao seu Ginjal que ameaça ser vendido para saldar dívidas. A dolorosa decisão de o vender e de abandonar a propriedade que durante gerações foi a casa da família, arrasta-se de adiamento em adiamento, até que um amigo próximo, filho de um mujique, servo da família, acaba por “salvar” a situação, comprando-a para ser dividida em lotes para construção de casas de campo, depois de derrubado o enorme pomar de ginjeiras. O Ginjal será destruído, todos se dispersarão, um mundo acaba, começa uma nova era. É a vida dos habitantes desta quinta durante os últimos meses antes do desmantelamento da herdade que nesta peça Tchekov toma para a construção do seu microcosmos: a proprietária viúva e o seu irmão, a sua filha e a sua filha adoptiva, a preceptora, as visitas da casa, os criados. E com a orquestração dos pedaços destas vidas nos devolve a vida inteira.
Sobre o projecto escreveu a encenadora: “Um trabalho sobre o espaço e o tempo. É como se, com os actores, partíssemos de uma página em branco ou do silêncio total, do esquecimento do sono, e depois, devagarinho, como se nos puséssemos a viver, ali, essa estranha e longa jornada fictícia, inventada por Tchekov, que se desenrola, a partir de uma aurora de primavera fria, através da descida do crepúsculo de um dia de verão, e de uma noite de baile trepidante, até a uma tarde gelada de outono.
A aposta deste trabalho, é ritmar a concordância destes quatro tempos em contraponto com a meteorologia afectiva e pessoal de cada uma das personagens. Algumas delas hão-de verificar, à sua custa, que “quem volta atrás no espaço, não volta atrás no tempo”(*)
(*) Vladimir Jankélévitch”
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