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sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Turismo Infinito

de António M. Feijó
a partir de textos de Fernando Pessoa
e três cartas de Ofélia Queirós
encenação Ricardo Pais
com a colaboração de Nuno M Cardoso
dispositivo cénico Manuel Aires Mateus
figurinos Bernardo Monteiro
desenho de luz Nuno Meira
sonoplastia Francisco Leal
voz e elocução João Henriques
interpretação
João Reis Álvaro de Campos
Emília Silvestre Maria José, Ofélia Queirós
Pedro Almendra Fernando Pessoa
José Eduardo Silva Bernardo Soares
Luís Araújo Alberto Caeiro

Teatro Nacional São João
no Teatro Nacional D. Maria II, de 11 a 26 de Janeiro de 2008



Sinopse
A cena figura uma mente particular, a de Fernando Pessoa. Sendo‑nos dado o privilégio de estar presentes, ouvimos e vemos uma sucessão de vozes e personagens, organizada em blocos de textos.
UM PRIMEIRO BLOCO pertence a Bernardo Soares e a Álvaro de Campos. Guarda‑livros
na Rua dos Douradores em Lisboa, Soares é Pessoa por defeito, um ininterrupto devaneio;
Campos, engenheiro naval, é Pessoa por excesso, a exuberância que este não se permitiu ter (e também um censor selvagem de si mesmo e dos outros).
Segue‑se uma transição com a carta da corcundinha ao serralheiro, em que a autora descreve a sós um tipo particular de pobreza.
NO SEGUNDO LONGO BLOCO os autores são Álvaro de Campos e “Fernando Pessoa”. Os textos descrevem experiências divididas (no caso de “Pessoa”, aqui na sua fase dita “interseccionista”, duas experiências diferentes cruzam‑se no mesmo texto, uma paisagem e um porto de mar, por exemplo; no caso de Campos, perfilam‑se poemas sobre viagens e sobre a experiência cindida do viajante). Uma transição liga autobiografia e criação poética. A correspondência Pessoa/Ofélia Queirós exemplifica‑a.
O TERCEIRO BLOCO exibe o resultado sádico dos impasses descritos nos textos anteriores, bem como diversas tentativas de os reparar. Esse esforço de reparação parece ineficaz, pois muitas vezes redunda numa contracção sentimental do sujeito.
O EPÍLOGO introduz Alberto Caeiro, em quem Pessoa via a resolução olímpica dessas tensões interiores insanáveis. Esta resolução é, todavia, momentânea, sendo, de facto, um epitáfio.
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O que sou essencialmente – por trás das máscaras involuntárias do poeta, do raciocinador e do que mais haja – é dramaturgo. O fenómeno da minha despersonalização instintiva, a que aludi em minha carta anterior, para explicação da existência dos heterónimos, conduz naturalmente a essa definição. Sendo assim, não evoluo: VIAJO. (Por um lapso da tecla das maiúsculas, saiu‑me
sem que eu quisesse essa palavra em letra grande. Está certo, e assim deixo ficar.) Vou mudando de personalidade, vou (aqui é que pode haver evolução) enriquecendo‑me na capacidade de criar personalidades novas, novos tipos de fingir que compreendo o mundo, ou, antes, de fingir que se
pode compreendê‑lo. Por isso dei essa marcha em mim como comparável, não a uma evolução, mas a uma viagem: não subi de um andar para outro, segui, em planície, de um para outro lugar.
Fernando Pessoa
Excerto de Carta a Adolfo Casais Monteiro (20 de Janeiro de 1935).

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Como que uma leitura encenada de textos de Fernando Pessoa.
Textos bem escolhidos e interpretações boas.
O dispositivo cénico e a encenação são sofríveis, mas parecem talvez adaptados a uma opção minimalista e de utilização de símbolos, comum quando se trata de Fernando Pessoa.
Gostei.

1 comentário:

Anónimo disse...

Adorei a peça, está muito bem realizada.
os textos estão bonitos e a carta da corcundinha está demais :D